O novo paradigma na tributação empresarial: O impacto ambiental como critério para menor ou maior carga tributária
A LC 214/25 cria IBS e CBS, usando impacto ambiental como critério para reduzir tributos
Não apenas tributaristas terão de se acostumar à sopa de letrinhas que a reforma tributária, regulamentada pela LC 214, de 16 de janeiro de 2025, exponenciou. ICMS, ISS, PIS e COFINS e IPI, velhos conhecidos, serão acompanhados - sim, porque haverá uma longa transição e coexistência de sistema tributário velho com sistema tributário novo - do IBS - Imposto sobre Bens e Serviços e da CBS - Contribuição Social sobre Bens e Serviços. Quem também terá de se familiarizar são aqueles que atuam em questões ambientais no mundo corporativo, na medida em que esses novos tributos terão o impacto ambiental como critério para sua incidência ou redução.
O que muda na tributação?
A nova norma trouxe três frentes principais de alteração tributária que afetam diretamente diversos setores econômicos, o imposto seletivo, o regime diferenciado e os regimes específicos.
1. Imposto Seletivo
A lei instituiu o Imposto Seletivo (art. 409), que incide adicionalmente sobre bens e serviços considerados "prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente". Na pauta ambiental, entre os itens que sofrerão maior carga tributária estão o carvão mineral, bens e serviços relacionados a veículos; embarcações e aeronaves; e bens minerais. As alíquotas do Imposto Seletivo serão previstas em lei ordinária, respeitando os critérios trazidos na própria LC.
Os automóveis, por exemplo, passarão a ser tributados de forma diferenciada com base em critérios como pegada de carbono, emissão de dióxido de carbono (CO2), reciclabilidade e eficiência energética. Para aeronaves e embarcações, a alíquota pode chegar a zero caso apresentem emissão zero de CO2 ou alta eficiência ambiental. Já para operações com bens minerais extraídos, as alíquotas devem respeitar o percentual máximo de 0,25% (vinte e cinco centésimos por cento), exceto para gás natural destinado à utilização como insumo em processo industrial e como combustível para fins de transporte, em que a alíquota deverá ser fixada em zero.
2. Regime diferenciado
A) Incentivo à reabilitação urbana
A lei também fomenta projetos de reabilitação urbana, especialmente em zonas históricas e áreas críticas de recuperação e reconversão urbanística. Com a redução de até 60% nas alíquotas do IBS e CBS para operações relacionadas a esses projetos, os municípios e o Distrito Federal têm a oportunidade de recuperar espaços degradados e promover a restauração de imóveis e melhorias na infraestrutura urbana.
Esse incentivo tem por objetivo a preservação patrimonial, a qualificação de espaços públicos, a recuperação de áreas habitacionais, a restauração de imóveis e melhorias na infraestrutura urbana e de mobilidade (art. 159). O alcance do benefício está restringido a prestação de serviços específicos (art. 162). Tais serviços podem ser referentes, entre outros, a (i) elaboração de projetos arquitetônicos, urbanísticos, paisagísticos, ambientais, ecológicos, de engenharia, de infraestruturas e de mitigação de riscos e seus correspondentes projetos executivos; (ii) performance ambiental, eficiência climática, limpeza, meio ambiente e saneamento.
Outro aspecto é a redução de 80% nas alíquotas para locação de imóveis situados em zonas reabilitadas, incentivando sua ocupação e revitalização econômica.
Esse sistema de incentivos pode impulsionar iniciativas urbanísticas focadas em soluções baseadas na natureza, promovendo medidas de mitigação e adaptação ao aquecimento global. Além disso, pode estimular a priorização de ocupação de áreas contaminadas ("brownfields"), fomentando seu gerenciamento e reabilitação para novos usos, reduzindo a pressão sobre áreas menos impactadas ("greenfields").
Ficará a cargo de lei ordinária estabelecer os conceitos de preservação, recuperação, reconversão e reabilitação urbana (art. 163, I).
B) Incentivo à logística reversa por coletores incentivados
A legislação também trouxe incentivos para empresas que adquirirem resíduos sólidos de pessoas físicas, cooperativas e organizações populares, podendo se beneficiar de créditos presumidos do IBS - Imposto sobre Bens e Serviços e da CBS - Contribuição Social sobre Bens e Serviços.
A LC traz uma conciliação de conceitos e instrumentos previstos na lei federal 12.305/10 (a PNRS - Política Nacional de Resíduos Sólidos). Inclusive, exclui do benefício a aquisição de resíduos previstos na PNRS como sujeitos a logística reversa (art.33), além de medicamentos e sucata de cobre.
Para os demais resíduos, tais como embalagens, ao comprar materiais recicláveis de catadores, a empresa gera um crédito tributário para compensar futuras obrigações fiscais, reduzindo seus custos operacionais.
3. Regimes específicos do IBS e da CBS
A) Tributação reduzida para biocombustíveis e hidrogênio de baixa emissão
Por alteração da EC 132/23, o art. 225, §1º, VIII, da Constituição Federal/1988 passou a prever a manutenção de regime fiscal favorecido para os biocombustíveis e para o hidrogênio de baixa emissão de carbono, assegurando-lhes tributação inferior à incidente sobre os combustíveis fósseis, capaz de garantir diferencial competitivo em relação a estes, prevendo que lei complementar traria a regulamentação para tanto.
Nesse contexto, a LC 214/25, prevê que as alíquotas do IBS e da CBS relativas aos biocombustíveis e ao hidrogênio de baixa emissão de carbono não poderão ser inferiores a 40% e não poderão exceder a 90% das alíquotas incidentes sobre os respectivos combustíveis fósseis comparados (art. 175, §1º). A regulamentação ainda está pendente, mas deverá considerar (i) a equivalência energética, os preços de mercado e as unidades de medida dos combustíveis comparados; e, (ii) o potencial de redução de impactos ambientais dos biocombustíveis ou do hidrogênio de baixa emissão de carbono em relação aos combustíveis fósseis de que sejam substitutos ou com os quais sejam misturados (art. 175, §2º).
B) Tributação reduzida para etanol e biodiesel oriundo de agricultura familiar
Também foi criado um regime específico para o EHC - etanol hidratado combustível, considerando como paradigma a gasolina C (art. 175, §§3º, 4º e 5º). Outro regime específico se refere ao biodiesel (B100) produzido com matéria-prima adquirida da agricultura familiar, que, por ato do Poder Executivo Federal poderá ter reduzidas as alíquotas específicas por unidade de medida da CBS (art. 175, §6º).
Como se preparar para essa nova realidade tributária?
Diante desse novo panorama, é essencial que empresas avaliem seu impacto ambiental e busquem estratégias para se adequarem à legislação, reduzindo sua carga tributária e garantindo conformidade regulatória. Algumas ações recomendadas incluem:
Revisão da cadeia produtiva para identificar oportunidades de redução de impacto ambiental;
Investimento em fontes energéticas renováveis e processos produtivos mais eficientes;
Reestruturação fiscal para otimização de créditos tributários;
Parcerias com cooperativas e fornecedores sustentáveis que detenham incentivos fiscais.
Com a ascensão da sustentabilidade como fator determinante para a competitividade, a tributação ambiental se mostra como uma oportunidade para as empresas se posicionarem de modo a se beneficiar dos incentivos e minimizarem os impostos adicionais.